
Brasil lidera desinformação sobre vacina na América Latina, diz estudo


Chamado de Desinformação Antivacina na América Latina e no Caribe (Anti-vaccine Disinformation in Latin America and the Carribean) o estudo mapeou 81 milhões de mensagens que foram publicadas em 1.785 comunidades de teorias da conspiração do Telegram que circularam entre 2016 e 2025 em 18 países da América Latina e do Caribe. E identificou 175 supostos danos que teriam sido atribuídos às vacinas e 89 falsos antídotos que estavam sendo vendidos como uma forma de neutralizar seus efeitos.
Notícias relacionadas:
- Baixa adesão de meninos à vacina do HPV preocupa governo de São Paulo.
- Sábado é Dia D da Campanha Nacional de Vacinação .
Para Ergon Cugler, coordenador do estudo e pesquisador do Laboratório de Estudos sobre Desordem Informacional e Políticas Públicas (DesinfoPop/FGV), o Brasil aparece na liderança porque ainda carece de regulação.
“Temos um ambiente digital ainda pouco regulado, com plataformas que lucram com o engajamento por meio do medo. Temos também uma sociedade polarizada, o que cria um terreno fértil para o discurso conspiratório”, disse à Agência Brasil.
Entre os líderes desse ranking também estão a Colômbia, com 125,8 mil mensagens falsas; o Peru, com 113 mil, e o Chile, com 100 mil publicações com conteúdos falsos.
>> Siga o canal da Agência Brasil no WhatsApp
Conteúdos falsos mais comuns
Entre as alegações falsas mais comuns que circularam nesses grupos de conspiração estava a de que a vacina provoca morte súbita (15,7% do total das mensagens mencionavam isso) ou altera o DNA de quem a toma (8,2%). Também houve falsas menções de que a vacina provoca Aids (4,3%), envenenamento (4,1%) ou câncer (2,9%).
Além disso, os grupos de teorias conspiratórias apontam possíveis “antídotos” contra as vacinas, misturando pseudociência, espiritualidade e consumo. Entre essas falsas alegações estavam a de que era preciso ficar descalço no solo para limpar energias do corpo (2,2% das mensagens mencionavam isso) ou comprar dióxido de cloro (1,5%) ou outras substâncias químicas.
Segundo o Ministério da Saúde, essas informações são totalmente erradas e podem, inclusive, provocar danos à saúde da população.
O dióxido de cloro tem venda controlada e é categorizado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) como saneante, ou seja, destinado à higienização, desinfecção ou desinfestação domiciliar, em ambientes coletivos e públicos, e no tratamento de água.
“Usado em produtos de limpeza, a substância, conhecida também pelos nomes MMS, CDS e Solução Mineral Milagrosa, foi muito propagada durante a pandemia de covid-19, mesmo sem nenhuma eficácia comprovada. O importante é entender o perigo de usar a substância, que é altamente reativa e tóxica, podendo levar as pessoas a graves riscos à saúde”, informou o ministério da saúde em uma publicação feita no ano passado, alertando que essa substância pode, inclusive, levar à morte.
Segundo Cugler, a desinformação é um mercado lucrativo e uma grande ameaça à saúde pública.
“Ela [a desinformação] funciona como um funil de vendas: primeiro, espalha medo com alegações falsas sobre vacinas e, depois, oferece produtos, cursos e terapias como supostas ‘curas’. O antivacinismo virou um mercado, onde o pânico é transformado em lucro. Essas comunidades exploram o medo, misturam pseudociência com espiritualidade e vendem soluções milagrosas sem base científica”, disse ele.
Esses conteúdos falsos, explicou o coordenador do estudo, utilizam jargões científicos para parecem sérios, mas não têm qualquer embasamento científico. “O objetivo é plantar dúvida e medo, minando a confiança na ciência”, esclareceu.
Pandemia
O volume de desinformação sobre vacinas foi ainda mais intenso durante a pandemia de covid-19. O levantamento feito pelo DesinfoPop mostrou que as postagens sobre vacinas em comunidades conspiratórias nos países da América Latina e Caribe cresceram 689,4 vezes entre os anos de 2019 e 2021, passando de 794 posts em 2019 para 547.389 em 2021.
Depois desse pico, o volume voltou a diminuir, mas não voltou ao que era antes: em 2025, com dados até o mês de setembro, ainda circulam 122,5 vezes mais conteúdo antivacina do que em 2019, somando cerca de 97 mil postagens.
Para o coordenador do estudo, essa desinformação é um projeto que atrapalha as políticas públicas de saúde e pode colocar a vida das pessoas em risco, abrindo espaço para o reaparecimento de doenças que já estavam controladas.
Por isso, ele orienta que as pessoas devem sempre desconfiar de conteúdos que apelam para o medo ou a emoção e, depois, checar a fonte de informação, ou seja, de onde veio essa notícia.
“Se [o conteúdo] não vem de uma instituição científica, de saúde pública ou de jornalismo profissional, é melhor não compartilhar [a notícia]. E o mais importante: sempre busque informação em fontes oficiais, converse com profissionais de saúde e lembre-se que vacina é uma conquista coletiva, não um risco individual”, ressaltou.
Vacinas são seguras
O Ministério da Saúde ressalta que a propagação de fake news é um dos fatores que mais impacta na adesão da população às campanhas de imunização. Para tentar reverter isso, o Ministério da Saúde lançou o programa Saúde com Ciência, uma iniciativa em defesa da vacinação e voltada ao enfrentamento da desinformação.
Pelo site da iniciativa, a população brasileira pode obter informações confiáveis sobre vacinação e também sobre as fake news que circulam na internet. Também é possível enviar informações duvidosas para que a equipe do Ministério da Saúde possa responder sobre essas dúvidas em seus canais.
O site traz ainda um passo a passo sobre como cada um pode denunciar, nos canais oficiais das plataformas digitais, os conteúdos enganosos, contribuindo para reduzir a sua disseminação na internet.